Eu te saúdo, ó Cruz, altar bendito
Onde Jesus morreu por nosso amor!
Lição feita com sangue do Senhor,
A ensinar-nos a via do Infinito!
Porque é que, ó bela Cruz, eu não imito
As almas que, a esvair-se em triste dor,
Choram a imolação do Redentor
Nos teus braços? Minha alma é de granito?
Oh, não!... que eu bem sei porque não choro:
Se é certo, cruz divina, que eu te adoro –
Sorri-me em ti dos céus a ideal visão.
Tu deste-nos a luz: eu amo-a tanto!
Tu deste-nos a graça: é dom tão santo!
Como hei-de chorar, dize-me então?
Lágrimas!... Convém muito que as poupemos
E que as nossas tolices deploremos
Em vez da Redenção…
(Im. do P.e Bourdaloue)
JESUS E A ADÚLTERA
I
RÉUS ACUSADORES
- Esta mulher que pena há-de sofrer,
Ó Mestre? Em adultério foi achada!
E Jesus a escutar, sem dizer nada,
No chão as culpas deles a escrever.
- Instrua-nos, Doutor, teu parecer.
Deve ser em castigo lapidada,
Conforme preceitua a lei sagrada?
Tudo ouvia Jesus sem responder...
Por fim ergueu-se e disse glacialmente:
- Quem dentre todos vós for inocente
Deve a primeira pedra arremessar.
Num desapontamento os fariseus
Foram-se desviando do Homem-Deus,
A quem já não queriam consultar…
II
PERDÃO SUBLIME
Ali ficou de pé, junto ao seu Deus,
A adúltera chorosa e arrependida:
A miséria e a bondade; a morte e a vida;
A noite do pecado e a luz dos céus.
Do seu rigor enfim depondo os véus,
Disse Jesus em voz compadecida:
- Onde essa gente ruim e presumida,
Que contra ti moveu tais escarcéus?
Ninguém te condenou, mulher? – Ninguém,
Meu Mestre e meu Senhor! – Pois eu também
Não te condeno. Vai. Não peques mais.
- Quando a santa, mais tarde, referia
O que Cristo dissera, não havia
Quem percebesse coisas tão astrais.
Núpcias
de Caná
Aos noivos Francisco Meira Veloso e
Otília Laura Diniz
I
De flores coroada,
Gentil como a alvorada,
Sob cândido véu soltos e flutuantes
Os cabelos de ouro, um pálio a
protegê-la,
Tal como a uma rainha – aí vai, entre os
descantes
Da alegre comitiva, a noiva de Simão.
Que graça! Vinde vê-la:
Não é gentil realmente?
Como sorri contente
A filha de Israel, rosinha em botão!
Pela avenida em festa onde a noite
desmaia
Ao clarear dos brandões, com que
desordem gaia
Trombetas e flautins, címbalos e
tambores
Convidam a cidade aos júbilos, ao riso!
Em volta da esposada, as amigas, levando
Numa das mãos a lampa acesa, na outra
flores,
Vão dançando, dançando,
E chovendo sobre ela o melífluo granizo
Das frases de louvor qua a alma feminina
Raramente declina…
E o cortejo lá segue. Aonde vai a
nubente?
Pérola da Caná, diz-me: aonde vais?
Para casa do noivo. O seu futuro esposo
A espera impaciente…
De joelhos recebida a bênção de seus
pais,
Ao ninho paternal disse um adeus saudoso
–
E uma nobre missão ela vai realizar:
Construir um lar
Puro e santo e bendito.
Chega. É apresentada. Um denso véu
recebe;
Na escritura se confirma a ditosa
promessa;
Procede-se em seguida às abluções do
rito;
De vinho se enche um copo e todo o mundo
bebe;
Uma oração enfim… e o banquete começa.
II
Regressando a Caná,
Jesus foi convidado à festa nupcial.
Maria estava lá, que o noivo era seu
sobrinho…
Aceitou pois Jesus o convite cordial:
Dignou-se ser padrinho
Do enlace conjugal;
Quis com a sua presença as puras
alegrias
Da família sagrar numa aurora de amor.
Não vinha só no entanto o nosso
Salvador:
Convidaram também com nobres cortesias
Pedro, Bartolomeu, André, Filipe, João…
Crescida a soma, assim, de hóspedes, por
surpresa,
E como o bom casal não brilhasse em
riqueza,
Depressa se esgotou do vinho a provisão…
Maria, sa santa Mãe, Maria, o coração
Transbordando carinho,
Dos noivos pressentiu a vergonha, o
pesar.
E a Jesus segredou em prece: - Não há
vinho.
- Deixe o caso comigo – advertiu
docemente
O Filho divinal. – Vou tudo remediar,
E tu serás contente, minha Mãe e
Senhora!
Se a graça ainda não fiz, é que não era
a hora
De tornar evidente
Ao clarão de um milagre, a missão que do
Pai
Recebi, vido ao mundo.
Aos serventes então diz ela: - Executai
Tudo o que ele disser.
Expectativa.
Ao fundo
Da sala do banquete há seis talhas vazias…
- Ide, ordena Jesus, encher de água
essas talhas.
Quase despida já a mesa de vitualhas,
Ao provar o licor que evocava ambrosias,
Ficou o arquitriclino altamente admirado
De que o vinho melhor o tivessem
guardado
(E tanto!) para o fim…
Presidia ao festim
E o milagre não vira:
Apenas os serventes
E a Virgem, que a pedira,
Da graça eram cientes…
19-V-1923
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